Por existirem reservas limitadas, a água é cada vez mais estratégica. Apesar da quantidade existente na Terra permanecer inalterada, a sua crescente utilização e poluição são questões problemáticas.
Cláudia Fulgêncio
Ciclo da Água
A quantidade total de água existente na Terra, nas suas três fases (sólida, líquida e gasosa), tem-se mantido constante, apesar da sua distribuição por fases se ter modificado (na época de máxima glaciação, o nível médio dos oceanos situou-se cerca de 140 m abaixo do nível actual).
A água da terra, que constitui a hidrosfera, distribui-se por três reservatórios principais: os oceanos, os continentes e a atmosfera, entre os quais existe uma circulação constante – ciclo da água ou ciclo hidrológico.
A transferência de água da superfície do Globo para a atmosfera, sob a forma de vapor, dá-se principalmente por evaporação directa e por transpiração das plantas e dos animais – evapotranspiração. Apenas uma ínfima parte sublima (passa directamente da fase sólida à de vapor).
O vapor de água é transportado pela circulação atmosférica e condensa-se após percursos muito variáveis, que podem ultrapassar 1000 Km. A água condensada dá origem à formação de nuvens e nevoeiros, e à precipitação.
A energia solar é a fonte de energia térmica necessária para a passagem da água das fases líquida e sólida para a fase de vapor; é também a origem da circulação atmosféricas que transporta o vapor de água e desloca as nuvens. A atracção gravítica dá lugar à precipitação e ao escoamento.
A água que precipita nos continentes pode tomar vários destinos. Uma parte é devolvida directamente à atmosfera por evaporação; outra origina o escoamento à superfície do terreno – escoamento superficial, que se concentra em sulcos cuja reunião dá lugar aos cursos de água. A parte restante infiltra-se, penetrando no interior do solo e subdividindo-se numa parcela que se acumula na sua parte superior e pode voltar à atmosfera por evapotranspiração e noutra que se encaminha para os lençóis de água e vai integrar o escoamento subterrâneo.
Tanto o escoamento superficial como o subterrâneo vão alimentar os cursos de água que desaguam nos lagos e nos oceanos, ou vão alimentar directamente estes últimos.
O escoamento superficial constitui uma resposta rápida à precipitação e cessa pouco tempo depois dela. O escoamento subterrâneo, em especial quando se dá através de meios porosos, ocorre com grande lentidão e continua a alimentar os cursos de água longo tempo após ter terminado a precipitação que o originou. Assim, os cursos de água alimentados por aquíferos apresentam regimes de caudal mais regulares.
A Água e o Homem
A forte dependência do Homem relativamente à água sempre condicionou a sua forma de vida, desde os locais escolhidos para se estabelecer, até à forma como procurava explicar os fenómenos naturais. De facto, a água encontra-se omnipresente nas mitologias, associada a deuses e a divindades, e inspirou numerosas lendas.
Para utilizar a água e dominar os efeitos da sua ocorrência em excesso, o Homem tem captado a água subterrânea em poços e minas e a água superficial nos rios, lagos naturais e albufeiras criadas por barragens, que asseguram a regularização do caudal. Para defesa contra inundações, tem construído diques, e para o transporte da água, canais, aquedutos, túneis e condutas. Para elevar a água a ser utilizada, construiu utensílios e máquinas hidráulicas.
Hoje em dia, este recurso natural está presente em múltiplas actividades e, como tal, é utilizado para finalidades muito diversificadas, em que assumem maior importância o abastecimento doméstico e público, os usos agrícolas e industriais e a produção de energia eléctrica.
Até um passado recente, as necessidades de água cresceram gradualmente, acompanhando o lento aumento populacional. No entanto, a era industrial trouxe a elevação do nível de vida e o rápido crescimento da população mundial, a que se associaram a expansão urbanística, a industrialização, a agricultura e a pecuária intensivas e a produção de energia eléctrica, levando a crescentes exigências de água.
Para além do problema da satisfação actual das necessidades de água, coloca-se ainda o problema de algumas utilizações prejudicarem a sua qualidade, sendo esta muitas vezes restituída aos meios naturais com características que lhe são prejudiciais. É bem conhecida a poluição provocada pelos usos domésticos (p.ex. detergentes), agrícolas (p.ex. pesticidas e fertilizantes) e industriais (p.ex. produtos químicos vários).
Para além dos problemas de satisfação das necessidades de água, põem-se problemas contrários, relacionados com o excesso desta, que pode causar níveis freáticos prejudicialmente elevados, submersão, erosão dos solos e efeitos de corrente nos leitos de cursos de água.
Níveis freáticos que quase atinjam a superfície do terreno podem ocorrer nas zonas baixas, em consequência de dificuldades de drenagem subterrânea dos solos. A submersão pode ser causada pela acumulação do escoamento superficial produzido em zonas próximas, sem que seja assegurada a drenagem superficial necessária, ou por transbordamento dos leitos dos cursos de água.
A erosão hídrica provoca a perda de solos a jusante, em zonas de menor velocidade de escoamento, a deposição de sedimentos que podem contribuir para a degradação de solos cultiváveis, a subida de leitos fluviais, a obstrução de sistemas de drenagem artificial, a redução da capacidade de armazenamento de albufeiras e o assoreamento de estuários e portos. O excesso de água nos rios pode provocar erosão dos leitos e inundação dos terrenos marginais, com os consequentes danos em culturas, infra-estruturas, edifícios e equipamentos.
Na resolução de problemas de satisfação das necessidades de água e do domínio da água em excesso, surgem frequentemente interesses antagónicos. É o caso de uma albufeira destinada ao fornecimento de água para a produção de energia hidroeléctrica e para rega e ao amortecimento das cheias a jusante. Para um mesmo volume de albufeira, quanto maior for a parcela reservada para amortecer as cheias, menor será o volume disponível para regularizar o caudal, e consequentemente, menor será o volume que é possível utilizar para a produção de energia e para a rega.
As crescentes necessidades de água, a limitação dos recursos hídricos, os conflitos entre usos e os prejuízos causados pelo excesso de água, exigem que o planeamento e a gestão da utilização e do domínio da água se façam em termos racionais e optimizados, tornando-se imprescindível a consciencialização para os problemas da água, de políticos, técnicos e da população em geral.
Carta Europeia da Água
Proclamada pelo Conselho da Europa em Maio de 1968, a Carta Europeia da Água integra 12 princípios básicos para a gestão e salvaguarda deste recurso natural tão valioso:
I - Não há vida sem água. A água é um bem precioso indispensável a todas as actividades humanas.
II - Os recursos hídricos não são inesgotáveis. É necessário preservá-los, controlá-los e, se possível, aumentá-los.
III - Alterar a qualidade da água é prejudicar a vida do homem e dos outros seres vivos que dela dependem.
IV - A qualidade da água deve ser mantida em níveis adaptados às utilizações e, em especial, satisfazer as exigências da saúde pública.
V - Quando a água, após ser utilizada, volta ao meio natural, não deve comprometer as utilizações que dela serão feitas posteriormente.
VI - A manutenção de uma cobertura vegetal apropriada, de preferência florestal, é essencial para a conservação dos recursos hídricos.
VII - Os recursos hídricos devem ser objecto de um inventário.
VIII - A eficiente gestão da água deve ser objecto de planos definidos pelas autoridades competentes.
IX - A salvaguarda da água implica um esforço muito grande de investigação científica, de formação técnica de especialistas e de informação pública.
X - A água é um património comum cujo valor deve ser reconhecido por todos. Cada um tem o dever de a economizar e de a utilizar com cuidado.
XI - A gestão dos recursos hídricos deve inserir-se no âmbito da bacia hidrográfica natural e não no das fronteiras administrativas e políticas.
XII - A água não tem fronteiras. É um bem comum que impõe uma cooperação internacional.
Bibliografia
Quintela, A., Coutinho, M.; “ A Água, a Terra e o Homem” (1988); Campanha Educativa da Água; Direcção Geral dos Recursos Naturais.
http://www.aguas-cavado.pt/carta.htm
Sugestões de Consulta:
http://www.simoqua.pt/agua/origens.htm
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